O modelo biomédico não é suficiente para explicar a dor crônica. Embora muitos clínicos tenham adotado uma nova forma de pensar e apliquem uma visão biopsicossocial ampla em relação à (pacientes) dor crônica, a maioria dos profissionais (inclusive eu) receberam treinamento / educação focada no modelo biomédico. Sabemos de uma série de estudos que o treinamento biomédico pode influenciar as atitudes dos terapeutas e as fortes crenças sobre a dor crônica. No entanto, poucos terapeutas estão cientes do impacto que suas próprias atitudes e crenças tem sobre o paciente, e provavelmente aqueles que estão cientes disso, adotam uma visão biopsicossocial mais ampla. Aqueles que não estão conscientes provavelmente se sentem entediados com este modelo biopsicossocial – eles provavelmente nunca conseguiram uma compreensão completa do modelo ou usam desculpas (por exemplo, eu uso a CIF para nortear minhas avaliações) para cobrir o seu foco no modelo biomédico puro.
Mais especificamente, as atitudes e crenças do terapeuta influenciam as atitudes e crenças do paciente. Caso o terapeuta tenha fortes crenças biomédicas em relação à dor crônica, o paciente adotará essas crenças. Exemplos típicos de tais crenças biomédicas incluem: a dor está relacionada com a lesão tecidual; a Dor lombar crônica é devida à instabilidade da coluna vertebral ou um disco intervertebral lesado, o levantamento de objetos pesados com má postura é perigoso para a coluna lombar; os pacientes com lesões em chicote (whiplash associated disdorders) sofrem por muito tempo – então deve haver algo errado com a coluna cervical. A teoria de auto-regulação por Leventhal et al. (2003) fornece uma excelente estrutura conceitual para explicar como as crenças dos pacientes (e dos terapeutas) influenciam seu comportamento (a figura abaixo ilustra isso).
Como as atitudes e crenças do paciente influenciam a adesão ao tratamento, os terapeutas devem estar cientes de que enfocar o modelo biomédico para a dor musculoesquelética crônica provavelmente resultará em má adesão às diretrizes de tratamento baseadas em evidência, menor aderência ao tratamento e menor resultado. O ponto de partida para a prevenção desse mau resultado envolve a auto-reflexão e auto-crítica. Por exemplo, evidências de ensaios controlados aleatórios que abordam a reabilitação da dor músculo-esquelética crônica revelaram que a auto-eficácia adequada, o combate a depressão, a modificação da catastrofização da dor e a atividade física devem ser as metas primárias de tratamento para pacientes com dor musculoesquelética crônica. Será que esses são os 4 principais alvos dos nossos tratamentos para pacientes com dor crônica? Os terapeutas com maior compreensão e tratamentos mais atualizados para pacientes com dor crônica muitas vezes dizem (ou acham) que é muito difícil mudar o comportamento dos pacientes. Em nossa experiência, isso pode acontecer em casos específicos, mas a maioria dos pacientes é “gerenciável”. Os terapeutas, no entanto, especialmente aqueles que têm muitos anos de experiência clínica, muitas vezes são mais difíceis de “ensinar”.
Uma vez que o terapeuta mantenha atitudes e crenças baseadas nas evidências sobre a dor crônica, a avaliação das atitudes e crenças dos pacientes provavelmente se tornará natural. Se o fizerem, eles podem facilmente integrar as informações sobre as atitudes e crenças dos pacientes (incluindo percepções de doença) no processo de raciocínio clínico, o que resulta em programas de tratamento adaptados individualmente que abordam especificamente as atitudes e crenças dos pacientes para melhorar a adesão e os resultados do tratamento. Isso é muito divertido e impede programas tratamento ‘chatos’ (chato para o terapeuta especialmente!). É muito divertido porque desafiar as atitudes e crenças inadequadas dos pacientes é tipicamente um desafio terapêutico imprevisível, mas que também é muito inspirador. Cada paciente será único. Sempre haverá casos novos e com novos desafios. Aproveite!
2 thoughts on “Mudar o nosso próprio comportamento (terapêutico) é mais difícil do que mudar o comportamento dos nossos pacientes”
Carlos Alberto Vieira de Melo
30 de novembro de 2016 at 23:13
Excellent
Carlos Alberto Vieira de Melo
30 de novembro de 2016 at 23:16
Good