15 de julho de 2019
A recorrência de dor lombar em um ano é comum? 69% das pessoas com dor lombar podem ter novos episódios em um ano, mas com poucas limitações.
Já se sabe que existe grande variabilidade no curso clínico de pacientes que apresentam dor lombar aguda. Estudos anteriores descreveram que em 1 ano, os escores médios de dor e incapacidade desses pacientes são baixos (Costa et al., 2012; Itz et al., 2013); entretanto, esses escores fornecem pouca informação sobre diferentes trajetórias de dor que os pacientes podem apresentar nesse período. Sabe-se que a maioria dos pacientes vão se recuperar no período de 3 meses (Costa et al., 2012). Porém, mesmo durante as 6 e 12 primeiras semanas onde os pacientes tendem a melhorar, existe grande variabilidade entre os pacientes, já que alguns melhoram em poucos dias, outros levam mais tempo para se recuperar, e outros não se recuperam (Henschke et al., 2008). A possibilidade de identitificar as chances de recuperação desses pacientes seria muito útil para os clínicos e pacientes, já que auxiliaria na tomada de decisão quanto ao número de atendimentos necessários e tipo de tratamento a oferecer.
Os Modelos de Predição Clínica auxiliam no processo de tomada de decisão utilizando dados clínicos para estimar probabilidades de desfechos clínicos (Laupacis et al., 1997), por exemplo, risco de quedas, risco de persistência de dor, ou chance de recuperação de dor. Já existem alguns Modelos de Predição Clínica anteriores desenvolvidos para pacientes com dor lombar, porém, a maioria deles tem objetivo de predizer risco de dor persistente ou não-recuperação em 12 meses. Embora essa informação seja útil, o objetivo de predizer resultados em um ano pode não ser relevante para auxiliar os clínicos na tomada de decisão sobre o tratamento de curto e médio prazo de pacientes com dor lombar aguda.
Existe apenas um Modelo de Predição Clínica desenvolvido para predizer a probabilidade de recuperação em pacientes com dor lombar aguda em pontos específicos de tempo durante os primeiros 3 meses (Hancock et al., 2009). Esse estudo descobriu que os pacientes com intensidade inicial de dor menor que a média, duração mais curta de dor e poucos episódios anteriores de dor lombar provavelmente se recuperariam mais rápido do que pacientes sem essas características.
Embora esse Modelo de Predição Clínica seja capaz de fornecer alguma informação sobre as chances de recuperação de um episódio de dor lombar nos primeiros 3 meses, sua principal limitação é a falta de discriminação (C-statistic = 0,65), que é uma medida estatística que indica quão bem o modelo diferencia entre pacientes que se recuperam e aqueles que não se recuperaram, e é portanto, uma característica importante para determinar a qualidade do Modelo criado.
É possível que um Modelo similar ao anterior, desenvolvido para ser utilizado uma semana após o atendimento inicial com o clínico seria mais discriminativo, uma vez que poderia incluir a variável mudança na intensidade da dor durante a primeira semana como uma variável preditiva. Estudos anteriores apontam que a mudança na intensidade da dor é preditiva de desfechos em pacientes com dor lombar. Além disso, o desenvolvimento de um novo Modelo para ser utilizado uma semana após o primeiro atendimento está de acordo com as diretrizes clínicas atuais para o tratamento de dor lombar em atenção primária, que sugerem intervenção simples/minima (como por exemplo, aconselhamento e analgésicos), com retorno em 1-2 semanas para determinar se a terapia adicional é necessária (Koes et al., 2010).
Portanto, o objetivo do nosso estudo foi desenvolver um novo Modelo de Predição Clínica para ser utilizado uma semana após o atendimento inicial. O Modelo seria utilizado em pacientes que ainda têm dor lombar neste retorno ao clínico para predizer probabilidade de recuperação de dor em 1 semana, 1 mês e 3 meses após o retorno ao clínico. O estudo também tem por objetivo fornecer essas informações de forma simples, de fácil utilização e interpretação por clínicos e pacientes.
Basicamente, nós testamos 10 possíveis variáveis preditivas para o desfecho de recuperação de dor, e destes, 5 permaneceram no modelo final: duração do episódio atual de dor lombar, número de episódios anteriores, depressão, intensidade da dor, e mudança na intensidade da dor entre o primeiro atendimento e o retorno ao clínico. Esse modelo multivariável final foi utilizado para gerar probabilidades para recuperação em 3 pontos de tempo para todas as combinações de variáveis preditivas. Escolhemos 3 pontos de tempo que consideramos clinicamente importantes: 1 semana, 1 mês e 3 meses após o retorno ao clínico.
No quadro abaixo é possível visualizar as probabilidades de recuperação em 1 semana. É possível identificar as 5 variáveis preditivas e as probabilidades, coloridas de acordo com diferentes bandas de probabilidade de recuperação, para diferentes combinações de variáveis preditivas. Por exemplo, se um paciente apresenta duração de episódio anterior entre 7 a 14 dias, 0 a 2 episódios anteriores, pontuação de depressão entre 0 a 3, pontuação de intensidade de dor no retorno ao clínico entre 2 e 4, e uma mudança de dor de 4 ou mais, ele terá 59% de chance de se recuperar em uma semana.
Esse estudo demonstrou que um Modelo de Predição Clínica usando 5 variáveis que podem ser facilmente coletadas como parte da prática clínica diária foi capaz de predizer a probabilidade de recuperação de um episódio de dor lombar aguda em 1 semana, 1 mês e 3 meses após o retorno ao clínico. O Modelo de Predição Clínica e os quadros associados são de fácil utilização e interpretação. As probabilidades preditas demonstram como o Modelo de Predição Clínica pode ser utilizado para informar a tomada de decisão compartilhada entre clínicos e pacientes.
Importante ressaltar que a realização de validação externa desse Modelo é necessária. É preciso testar se esse Modelo continua a demonstrar boa discriminação e calibração (medidas estatísticas necessárias para determinar a qualidade do Modelo criado), quando aplicado a uma amostra semelhante de pacientes.
Referências
Costa LCM, Maher CG, Hancock MJ, McAuley JH, Herbert RD, Costa LOP. The prognosis of acute and persistent low-back pain: a meta-analysis. CMAJ : Canadian Medical Association journal = journal de l’Association medicale canadienne 2012;184: E613-624.
Hancock MJ, Maher CG, Latimer J, Herbert RD, McAuley JH. Can rate of recovery be predicted in patients with acute low back pain? Development of a clinical prediction rule. European journal of pain 2009;13: 51-55.
Henschke N, Maher CG, Refshauge KM, Herbert RD, Cumming RG, Bleasel J, York J, Das A, McAuley JH. Prognosis in patients with recent onset low back pain in Australian primary care: inception cohort study. Bmj 2008;337: a171.
Itz CJ, Geurts JW, van Kleef M, Nelemans P. Clinical course of non-specific low back pain: a systematic review of prospective cohort studies set in primary care. European journal of pain 2013;17: 5-15.
Koes BW, van Tulder M, Lin CW, Macedo LG, McAuley J, Maher C. An updated overview of clinical guidelines for the management of non-specific low back pain in primary care. Eur Spine J 2010;19: 2075-2094.
Laupacis A, Sekar N, Stiell IG. Clinical prediction rules. A review and suggested modifications of methodological standards. Jama 1997;277: 488-494.
É graduada em Fisioterapia pela Universidade Cidade de São Paulo – UNICID (2010), especialista em Fisioterapia Aquática pela UNICID (2012) e mestre em Fisioterapia pela UNICID (2014). Atualmente é aluna de doutorado da Macquarie University (Sydney,Australia), onde estuda especialmente recuperação de pacientes com dor lombar aguda e recorrências de dor lombar em pessoas recentemente recuperadas de um episodio previo.
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